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  • Foto do escritorHenrique Junior

#5 Coleta de Campo – O misterioso Saci (Tapera naevia)

Atualizado: 22 de jun. de 2022

Crispim, Peixe-frito, Maty taperê, Matinta-pereira, Sem-fim, Seco-fico, Tico-tico-três-cabeças ou simplesmente Saci. Ave agourenta, tinhosa; para muitos, é o próprio Saci-pererê em forma de ave; para outros, é a Matinta-pereira que, em forma de ave, põe-se a importunar a todos com seu assovio melancólico. Seja de dia ou até mesmo durante as noites escuras, seu canto ecoa próximo às vilas, nas taperas; canto esse que ninguém sabe ao certo de onde vem. Já enfastiado dessa toada agourenta, não há para o matuto solução senão oferecer à Matinta aquilo que ela mais gosta, café e tabaco. Prometem em voz alta e, no dia seguinte, ela surge já em sua forma humana, velha, maltrapilha. Ela chega mendiga por fumo, recolhe sua oferenda e se esvai. Para onde, ninguém sabe, mas fica a asserção de que um dia ela voltará.


É uma ave de tamanho médio, um pouco maior que um Sabiá (Turdus sp.), porém mais esguia, longilínea. Vive no emaranhado de galhos secos, quase sempre da sua própria cor, o que a torna invisível aos olhos menos cuidadosos. Velhaca, ela nunca revela onde está. Quando está próxima, vocaliza baixinho, aludindo estar longe. Quando se afasta, brame de toda sua voz; seu canto ecoa pelos quatro cantos, até meio quilômetro. Para quem ouve o saci, fica a ilusão de que ele está por perto, mas de nada adianta procurar; tal qual o seu xará Pererê, ele sempre consegue nos enganar.

Sua destreza em ludibriar os outros não se limita a nós homens. Faz vítimas entre vários animais, até mesmo entre as aves. Quando desce ao solo para procurar pequenos animalejos, ele projeta suas álulas escuras em rápidos movimentos, alternados com aberturas de asas, topete e movimentos de pescoço, conferindo-lhe um aspecto assustador de uma criatura mítica com três cabeças ou quatro asas. [2]


A astúcia do saci não se aprende, já está no sangue e se faz presente até mesmo no ninho. Os pais dessa espécie não fazem ninhos, tampouco ocupam de seu tempo para criar seu rebento. Depois de fecunda, a fêmea sai em busca de ninhos de outras espécies que compartilham com o saci o mesmo habitat. Curutié, joão-teneném, joão-graveto, joão-botina, seja lá quem for o joão, todos eles já caíram na tapeação do saci. Na ausência dos verdadeiros donos do ninho, a mãe saci chega. Desconfiada, olha os arredores e, já certa de que ninguém verá sua trapaça, ela calmamente põe seu ovo e então vai embora decidida a nunca mais voltar. Vai com a certeza de que o instinto maternal impedirá a mãe adotiva de abandonar o seu filhote.


Embora bem maior que a espécie que criará o filhote, o saci põe ovos pequenos, o que facilita camuflá-los entre os verdadeiros ovos da mãe adotiva. Sábia, a natureza dotou os ovos do saci de outra importante particularidade: eles sempre eclodem primeiro que os demais ovos do ninho, o que faz do sacizinho sempre o primogênito da família. Seu crescimento é vertiginoso e em pouco tempo ele já está praticamente do tamanho de seus pais adotivos. No ninho, o saci ainda faz uma última e mais perversa traquinagem: usa seu bico em forma de alicate para, na ausência dos pais, trucidar seus irmãos adotivos.


Ao sair do ninho, o saci não raro já está maior que seus pais adotivos que, cegados pelo instinto materno, persistem em alimentá-lo com o mesmo carinho devotado a um filho biológico, e dão duro para conseguir fazê-lo. [3]


Já adulto, o saci abandona os seus pais adotivos e segue seu ardiloso ciclo. Ciclo este capaz de despertar profundamente nossa curiosidade e interesse nessa misteriosa ave cercada por lendas e superstições.

Saci-Tapera-Naevia-Striped-Cuckoo

Referências bibliográficas:

  1. Sick, H. (1997) Ornitologia brasileira. Rio de Janeiro: Ed. Nova Fronteira, 862p.

  2. Folclóricas, Editoria de Pesquisas. Folclore Brasileiro Ilustrado – O Mito da Matinta Pereira, 2016. Disponível em <http://sitededicas.ne10.uol.com.br/folk_matinta.htm#link1> Acesso em Set/2017

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